Os pais de hoje

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Juiz Reinaldo Cintra

O juiz Reinaldo Cintra é o titular da Vara da Infância e da Juventude da Lapa desde 2008. Motociclista nas horas de lazer, ele é formado pela USP. Foi o responsável pela área de infância e juventude no Conselho Nacional de Justiça. 

Em 2010 representou o Brasil no capítulo de jovens e adolescentes na revisão da Convenção de Haia, na Holanda. Para comemorar o Dia dos Pais, ele fala sobre o papel atual dos homens na educação dos filhos e outros temas.

A família brasileira está diferente?
Antes era a família pai-mãe-filhos. Ela ficava em casa cuidando da educação dos filhos e o pai era o responsável pelo dinheiro e a figura da autoridade na casa, aquele que dava a última palavra, o chefe da casa. Nos anos 1970/80, a mulher sai de casa e busca sua realização pessoal e uma profissão. Uma das razões foi a incapacidade dos homens de ser o único provedor com a queda dos salários.

Essa é a realidade atual das famílias?
Ainda hoje, nas famílias de classes mais baixas a mulher trabalha menos. Mas as mulheres das classes média ou alta estão mais escolarizadas e querem exercer suas profissões. Mas como a mulher é quem gera a criança, tem, geralmente, uma ligação maior com os filhos. E temos o fator educacional. Ainda hoje a mulher tem o viés educacional voltado para a maternidade. Dificilmente a mulher se sente completa se não teve filho.

O pai atualmente está mais atuante?
Ainda temos, em bom número, a visão do pai provedor e da mãe cuidadora dos filhos. Mas quanto mais jovens as pessoas, menos arraigada essa imagem. Hoje, a divisão das tarefas domésticas e a relação familiar se alteraram. O homem ajuda em casa, leva os filhos à escola, participa mais da criação.

Quando o casal se separa, é com a mãe que a maioria dos filhos fica?
O mais comum é a mulher assumir a guarda dos filhos. Até por razões sociológicas. Na maior parte das vezes, o homem ganha mais do que a mulher… Mas isso está mudando. Hoje temos mulheres pagando pensão aos ex-maridos. Isso é recente em nossa legislação, tratar o pai e a mãe como pessoas iguais. E estou totalmente de acordo com isso. A guarda compartilhada resulta do desejo dos homens de participar da criação dos filhos, na formação e na educação.

Há um número crescente de pais jovens a cada dia. É um problema?
A sociedade deu uma liberdade muito grande para os adolescentes e faltou a orientação da família para esses jovens na instrução de como se prevenir em relação aos métodos contraceptivos e para evitar doenças transmitidas por via sexual. Os jovens não têm consciência de que a relação sexual tem consequências. E nos casos de gravidez de adolescentes, geralmente são as avós que assumem os bebês. São os novos hábitos. O jovem hoje tem muita informação e mobilidade e quer sempre o máximo e o prazer imediato. Muitas vezes isso acaba gerando uma gravidez precoce, que não era esperada.

É comum os homens sozinhos assumirem a criação dos filhos?
É muito difícil a mãe abandonar os filhos. As famílias que eu atendo aqui, em sua maioria, não têm a figura masculina, nem pai, nem avô. Mães e avós, geralmente, são quem cuidam das crianças.

E o número de filhos por família, como se apresenta?
Famílias razoavelmente estruturadas têm poucos filhos. Por outro lado, aquelas pessoas que têm problemas com drogas geram um número de filhos absolutamente inacreditáveis, infelizmente. E as famílias ou tios assumem essas crianças.

Não pagar pensão alimentícia ainda dá prisão?
A única dívida, no Brasil, que dá cadeia é a falta de pagamento de pensão alimentícia.

Quais os casos que o senhor mais se depara no seu dia a dia?
Infelizmente, pais com problemas de drogas. É comum que o casal tenha problema. Algumas mães ainda mantêm um apego com o filho, mas muitas têm filhos sem identificação de quem é o pai. Nessa hora, a decisão do juiz é muito difícil. Primeiro é preciso proteger a criança e uma das coisas mais difíceis é dizer para aquela mãe que ela não tem capacidade de cuidar desse filho.

São família desestruturadas?
Essas famílias não têm uma relação boa. Meu trabalho é decidir o que é melhor para a criança. Só que nenhuma criança vive sem uma família. É preciso cuidar da criança e da família. Nosso trabalho é preparar essa família para que ela possa receber o filho de volta e ao mesmo tempo respeitar o tempo daquela criança. Ou encontrar uma outra família para cuidar dessa criança.

O que significa adotar uma criança?
Adotar não é um ato de bondade. Adoção é um desejo de ser pai ou mãe, não há bondade nenhuma nisso. É preciso acabar com o conceito de que adotar é um ato de bondade, de generosidade, a companhia na velhice, etc. A adoção deve ser em benefício da criança. Hoje se escolhe uma família para a criança. É mais justo e honesto para com a criança.

Que impressões o senhor tem da Lapa?
Tenho uma ligação muito antiga com a Lapa. Aqui foi o primeiro distrito que recebeu a primeira vara distrital fora do centro no Brasil. E meu pai, Renato Torres de Carvalho, foi quem instalou essa vara. A OAB-Lapa foi a que mais trabalhou para trazer essa vara para cá. Foi o primeiro exemplo de descentralização do judiciário e tem sido emocionante trabalhar aqui.

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