O amor está no ar

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O Dia dos Namorados está chegando e pensamos que seria apropriado falar de amor nesta edição, mas não o amor estudado e falado por psicólogos ou filósofos ou escritores ou poetas. Nem poderia ser esse amor “comercial”, vendido nos comerciais de tevê. Queríamos mais, queríamos alguém que falasse de amor no dia-a-dia, na prática. E um nome foi unânime na escolha: Dr. Nereu Mello. Ele, que nos brinda semanalmente com uma crônica no Jornal da Gente, era a pessoa mais indicada para o assunto: está casado há 55 anos com dona Angelina, mais conhecida por Gininha. Ambos são advogados, pais de três filhos, avós de sete netos e bisavós de um menino. Ele teve atuação destacada na Zona Oeste, como presidente da Associação dos Advogados da Lapa e da OAB/Subsecção Lapa. Também escreveu vários livros, foi professor de Direito e de idiomas (latim, português, francês, inglês).
Numa manhã ensolarada fomos encontrar o Dr. Nereu e sua esposa no aconchegante apartamento do casal. Foi uma conversa gostosa, em que ambos falaram sobre o amor que os une até hoje. Acompanhe aqui o bate-papo.

Qual sua opinião sobre o amor?
Dr. Nereu: Eu entendo que o amor é a força maior da vida. Na verdade, eu entendo que sem amor não há vida. Acho inclusive que há amor entre os animais. Houve até um filósofo que entendia que a existência de toda a vida é o amor, a atração. Os próprios átomos existem em razão da força do amor, que é a força da atração. Desde o mundo quântico ao mundo macrocósmico, as forças que unem esses mundos são o amor e a atração, porque o resto é espaço vazio. Materialisticamente, você vai encontrar no núcleo das células essa atração, o átomo não existe realmente, ele é só energia, e o amor é, nada mais nada menos, do que energia atrativa.

Mas os cientistas vão dizer que isso é ciência…
Dr. Nereu: É ciência, mas você não consegue descobrir qual é a linha divisória entre a ciência, o conhecimento e o sentimento. Você não distingue. O conhecimento vem pela percepção, que por sua vez só chega pela sensação, que se transforma em conhecimento, que se transforma em sentimento. O amor é sentimento.
Gininha: Amor é tudo isso que ele disse, mas essa atração entre duas pessoas é anterior a tudo isso, ela já vem determinada.
Dr. Nereu: Esquece tudo que eu falei. (risos)

Hoje em dia se casa e descasa muito facilmente. Isso é amor?
Dr. Nereu: Não, isso é só atração. É uma parte do amor, que começa com a atração, mas depois se transforma em cuidado, em dedicação, em amor mesmo. Enamorar-se. Eu sou sempre enamorado dela, estou sempre em estado de amor por ela. Se você examinar a palavra enamorar, vai ver que ela é composta de em + amor + estar, isso deu enamorar, então quando ela come, eu gosto de vê-la comer; quando ela sente dor no joelho, sinto pena disso. E vice-versa, ela me cuida também. Porque hoje nós somos idosos…

Mas já foram jovens!
Dr. Nereu: E como fomos!
Gininha: Também tivemos o amor da juventude.
Dr. Nereu: Nunca tivemos um dia de separação.

Mas será que está faltando paciência para os casais mais jovens?
Gininha: Eu acho que falta. Eles acham tudo muito fácil.
Dr. Nereu: Eles acham muito fácil casar e descasar. Então ficam só na primeira fase do amor e o amor tem que ir além disso.
Gininha: O divórcio trouxe essa modernidade. Antes as pessoas suportavam mais o casamento, porque havia o medo da mulher separada, que ficava numa situação muito difícil, não podia se relacionar livremente. Hoje não.
Dr. Nereu: O amor é outra coisa: é comer juntos, ler juntos, comentar livros juntos. Ela critica meus artigos: ela lê antes, sugere, a vida inteira foi assim. No exercício da profissão, ainda estudo casos no meu escritório aqui em casa, ela sempre quer saber do que se trata e depois fala três ou quatro palavras e reorienta meu pensamento.
Gininha: É uma visão exterior mais ampla…

Como vocês se conheceram?
Dr. Nereu: Deus nos deu o privilégio do amor, desde o começo, quando eu a vi… Eu era professor particular e ela precisava de aulas de latim. Ela era meninota, 15 anos, foi com o pai. Eu era um bom professor e olhei pra ela com interesse de aluna, mas me lembro dos olhos dela, grandes…
Gininha: Mas ele era muito careiro! Achei sua aula muito cara e fui pra outro lugar, que era bem mais barato. Mas quando ele desceu a escada pra me atender, eu pensei ‘nossa, mas que moço bonito!’ Isso é atração.
Dr. Nereu: Eu achei os olhos dela lindos…
Gininha: Quando começamos a namorar, ele achava que professor não podia namorar aluna. Foi um amigo dele que incentivou.
Dr. Nereu: Eu tinha muito medo de namorá-la.

Como é o amor na terceira idade?
Dr. Nereu: É o melhor! Nós não estamos na terceira idade, estamos na última (risos) Vou dizer pra vocês que nossa primeira fase foi linda, mas éramos muito ignorantes das coisas. Depois os filhos nasceram…
Gininha: É tranqüilidade. Casei com 17 anos e meio e aos 20 anos já estava no segundo filho. Mas ele queria casar quando eu ainda tinha apenas16!
Dr. Nereu: Nossa vida juntos teve várias fases: o namoro deixou muito pro noivado, o noivado deixou muito pra primeira fase do casamento, a primeira deixou muito pra segunda e a terceira nos deixou no céu.
Gininha: É que vai completando aquilo que falta com a experiência, a vivência.
Dr. Nereu: Muito deixou também pra nós agora. Se eu te disser que ela tem o quarto dela e eu o meu… E que isso não nos desune, mas nos une cada vez mais. Eu procuro por ela, ela procura por mim. Ela tem o banheiro dela, eu tenho o meu; ela tem a televisão dela, enorme, eu tenho a minha.
Gininha: Moramos num apartamento grande, que nos permite isso. Nós decidimos assim. Isso dá muita liberdade.
Dr. Nereu: Porque na velhice o velho ronca muito… (risos)
Gininha: E ele não gosta de televisão no quarto… Eu vejo novelas, filmes.
Dr. Nereu: Isso se chama respeito. Aquela atração toda aos 80 anos… É lógico que eu gosto de pegar na mão dela, abraçá-la, beijá-la, ela até me chama de sua bengalinha, até fico um pouco ofendido. (risos)
Gininha: É brincadeira…

Mas nessa fase isso tudo é possível.
Dr. Nereu: Aí é que está… O pior é o medo de que ela morra. Tenho muita preocupação com isso.

Por que será?
Dr. Nereu: O homem depende da mulher, a segurança do homem é a mulher.
Gininha: Mas a gente também depende deles.

Problemas financeiros afundam uma relação?
Dr. Nereu: No começo tivemos alguns… Deixa eu te contar uma historinha: estávamos namorando ainda quando passamos na frente de uma pastelaria. Eu falei ‘quer um pastel? Mas é um só mesmo, porque meu dinheiro só dá pra dois…’ Eu só tinha dinheiro pra dois pastéis;
Gininha: Pra você ver… Isso não nos separou. Mesmo depois de casados, situações apertadas só nos uniram mais ainda.

O que o senhor diria para os casais neste Dia dos Namorados?
Dr. Nereu: Até que a morte nos separe!

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