O novo bispo da Lapa

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O novo bispo da Lapa

Dom Julio Endi Akamine, 49 anos, é o novo Vigário Episcopal da Região da Lapa. Ele é o primeiro bispo nipo-brasileiro. Desde menino sempre foi assíduo nas missas que geralmente era levado pelo seu avô. Quando coroinha, recebeu o convite para estudar em Londrina (PR) no Seminário da Sociedade do Apostolado Católico São Vicente Pallotti. Foi ordenado sacerdote em 1988. Fez mestrado em teologia e mais tarde, o doutorado na Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma. Em maio passado, foi nomeado pelo papa Bento 16 bispo auxiliar da Arquidiocese de São Paulo e em julho, teve sua ordenação episcopal na Catedral da Sé e em seguida nomeado bispo da região da Lapa. Nesta entrevista, Dom Julio fala de suas funções, conta um pouco da sua vida e dos planos que tem para a região da Lapa.

Onde o senhor nasceu?
Sou de Garça, interior de São Paulo. Mas com 3 anos minha família veio para a capital e fomos morar no Tatuapé, onde me criei.

Como surgiu a vocação?
Meu avô era um homem muito religioso e ele me levava sempre na missa de domingo na paróquia Santa Marina no Tatuapé. Lá, fiz catequese, primeira comunhão, fui coroinha e com 10 anos, o padre Vitório me perguntou se eu queria ser padre. Como não queria contrariá-lo, disse “sim”. E aos 12 anos segui para o seminário em Londrina (PR), onde fiz o ensino fundamental e o médio. E foi lá que se desenvolveu a semente da minha vocação. Depois de passar pelo noviciato, fiz meus estudos em filosofia e teologia em Curitiba e em janeiro de 1988 fui ordenado padre.

O senhor já queria ser padre?
A vocação foi amadurecendo no decorrer do tempo que eu estava no seminário. Na verdade, quando criança, nunca sonhei em ser padre. Eu era como qualquer outra criança. Queria ser astronauta, piloto de avião… (risos).

Nunca teve dúvidas se tinha a vocação para ser padre?
Ser padre era uma coisa que a gente não via como um caminho a ser seguido. Pensava em outros. A ida ao seminário foi decisiva para abrir essa possibilidade. E mesmo estando no seminário, achava que não iria até o final. Era muito difícil, complicado, muitos estudos, muitas renúncias…

Como foi sua ida para Roma?
Depois de três anos como pároco da igreja de Santo Antonio, em Cambé (PR), pedi aos meus superiores para ir para o Japão trabalhar com os dekasseguis brasileiros (descendentes de japoneses que imigraram para trabalhar no Japão), que naquela época estavam indo em grande número para lá. Acho que eram mais de 200 mil brasileiros. Sabia que a grande maioria era católica cristã e eu não iria ter nem dificuldade com a língua (risos). Ia para trabalhar com a comunidade brasileira e aprender japonês. Eu era novo, cheio de curiosidade e vontade de aprender. Meus superiores acharam melhor me enviar para Roma para estudar mais. Lá, fiz teologia de 1993 a 1995 e depois de uma temporada em Curitiba, em 2001, voltei para Roma e fiz o meu doutorado. Ambos os cursos fiz na Universidade Gregoriana de Roma.

Como a ordem dos Panos está distribuída no Brasil?
Aqui no Brasil, são três unidades. Duas províncias e uma região. A província São Paulo Apóstolo, que é a minha, compreende os estados de São Paulo, Paraná, Bahia e Maranhão. A província Santa Maria (RS), que é a mais antiga e maior, engloba Rio Grande do Sul, oeste do Paraná, Mato Grosso, Rondônia, Manaus e uma missão em Moçambique, na África. E a região Mãe de Misericórdia tem sede no Rio de Janeiro e atua em Minas Gerais.
O senhor pode resumidamente explicar as funções de um bispo?
É uma tríplice função. Chamamos de ofício: governo, ensino e santificação. Ele governa, ensina e santifica. Governa o povo de Deus. Cuida do bom ordenamento da disciplina da vida da diocese. Tem autoridade na diocese. Aqui temos 34 paróquias. Não é só um ensino convencional e intelectual. É o ensino específico de ensinar a palavra de Deus. Além de todas as funções dos sacramentos, das liturgias, isso tudo entra o mundo santificado.

O senhor tem outras funções junto à Cúria?
Sim, nas coordenações arquidiocesanas, ensino religioso e também vida consagrada.

O senhor vai celebrar missas aqui na Lapa?
Ainda não defini uma agenda. Já celebrei aqui na paróquia da Lapa, mas tenho celebrado em outras paróquias daqui da diocese da Lapa. Quero ter contato com os padres e com a população.

Aos 49 anos, o senhor é o bispo mais novo da arquidiocese de São Paulo?
Não, temos dois bispos que são mais novos do que eu. E têm mais tempo de ordenação do que eu. Dom Milton, da região Belém, e Dom Edmar Perón.

E ser o primeiro bispo nipo-brasileiro. Isso tem um significado especial?
Não sei o motivo para só agora termos um bispo nipo-brasileiro. Espero que eu seja o primeiro e que outros venham em breve. Eu acho que estava na hora, afinal são 100 anos de imigração japonesa no Brasil.

O número de padres tem crescido no Brasil?
O número de padres tem aumentado. É lógico que as necessidades das paróquias aumentam mais rapidamente. Mas houve um discreto crescimento no número de ordenação de novos padres.

Os papas tiveram influência neste crescimento?
Sim, o papa João Paulo II teve influência, mas as dioceses fizeram um esforço enorme de cuidado com as vocações e as preparações dos padres.

E como o senhor pretende atender à demanda das paróquias por padres?
Da nossa parte, temos um compromisso maior de ir ao encontro e atender às solicitações das paróquias e despertar e motivar as vocações dos leigos. Não depende só dos padres e do bispo. Os fiéis devem também colaborar com a religião. E temos muitos colaboradores entre os leigos, sem dúvida.

Como o senhor vê os padres cantores como Marcelo Rossi e Fábio de Melo, que se transformaram em verdadeiros pop stars?
Acho que eles ajudam muito. É preciso ser um testemunho no meio de comunicação por meio da pregação através da música. Mas não é a única forma de ser padre. Há espaço para isto e eles encontraram e conquistaram o espaço deles, com talento, carisma e com a mensagem.

O Brasil é a nação com o maior número de católicos no mundo. Por que temos apenas o São Frei Galvão como santo canonizado?
Existem outros mais em processo de canonização. São vários. De fato, se passou muito tempo sem preocupação de mostrar a santidade presente na Igreja Católica aqui no Brasil. Com o papa João Paulo II se despertou para esse aspecto. Isso fazia parte do projeto dele. Tanto que ele beatificou e canonizou mais cristãos do que todos os outros papas juntos! No Brasil isso ficou por algum tempo em segundo plano, mas existem vários processos em andamento. Atualmente, o Vaticano está empenhado nisso.

As igrejas pentecostais estão tirando fiéis católicos?
É claro que isso nos preocupa. Afinal de contas, existem católicos, não sei dizer se poucos ou muitos, que passaram para as igrejas evangélicas. Mas são propostas diferentes. Não dá para dizer que é a mesma coisa.

Qual é a diferença entre pentecostais e católicos?
São muitas as diferenças. Não apenas no campo das promessas. Na Igreja Católica, são quatro as propriedades fundamentais: a unidade, embora a igreja católica seja uma “arca de Noé”, com gente diferente de todo o mundo, permanece sempre unida e uma. As seitas não têm essa unidade mais forte. A apostolicidade da Igreja foi fundada sobre os apóstolos. Há uma sucessão que vem desde os apóstolos a Jesus Cristo. As pessoas se sucedem. Eu não me proclamei apóstolo. Não fui eu que me proclamei bispo e nem fundador da Igreja. O fundador é Jesus Cristo. Eu recebi o ofício de bispo pelo colégio episcopal que sucedeu o grupo dos apóstolos que foi constituído pelo Cristo. Depois, a catolicidade presente no mundo todo. E a riqueza do mundo presente na Igreja Católica, com suas línguas, culturas… Chamamos de universalismo. E por fim, a santidade. Temos diversos testemunhos, é uma multidão que foi canonizada pela Igreja e outros tantos que a gente não sabe que foram santos.

A diocese vai dialogar com as outras igrejas?
A Igreja dialoga com todas as que aceitam o diálogo, sem nenhum problema. É preciso ter interesse, honestidade, e isso acontece através do diálogo religioso. Tem gente bem preparada e estudiosa para ver aquilo que nos une e aquilo que nos separa. Temos o diálogo no nível do serviço para os mais pobres e necessitados e podemos nos unir através disso de uma forma concreta. Temos o diálogo espiritual através das orações. E também é importante suspender algumas condenações de antigamente. Conhecendo, a gente se une. Não conhecendo, a gente se critica.

E as teorias criacionistas e da evolução?
A Igreja aceita a Teoria de Darwin sem nenhum problema. Desde que a origem de tudo seja Deus! Não existem dois princípios. Não existe um princípio do mal e um princípio do bem. Tudo é bom! Agora, se houve evolução de um primata até chegar ao ser humano, pode-se aceitar essa teoria. A ciência explica como surgiu, como aconteceu. Mas a ciência não explica qual a origem e o sentido disso. E tudo provém de Deus. Se houve alguma evolução, tudo bem, mas houve a intervenção de Deus! É possível aceitar a teoria da evolução sem renegar a própria fé!

Em dezembro, a paróquia da Lapa completa 100 anos. Como será sua participação?
Desejo me envolver. Apenas ainda não sei como. Centenário é sempre uma oportunidade de se resgatar o passado como também pensar no futuro.

O que o senhor faz em seu tempo livre?
Ultimamente não tenho tempo livre (risos). Gosto de vôlei, de caminhar, sou são-paulino e gostava de jogar futebol, mas atualmente não faço mais isso por causa da idade (risos). Gosto de ler, principalmente literatura brasileira, leio a Bíblia. Li muito Erico Veríssimo e outros autores brasileiros.

O senhor ficou surpreso de ser nomeado bispo da Lapa?
Sim, surpreso, mas é aquela surpresa boa.

Que mensagem o senhor deixa para a comunidade?
O que está no meu lema. São Paulo disse: “não desanimemos em fazer o bem”!

É bom ser padre?
A vida de padre é muito boa. Embora os jovens não acreditem.

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