A vida em condomínio

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O advogado Marcio Rachkorsky fala sobre as dificuldades de viver em condomínios

O advogado Marcio Rachkorsky é especialista em direito imobiliário. Nasceu e foi criado na Lapa. Formado pela PUC-SP, Marcio é casado e tem um casal de filhos. Mora na Lapa e diz ser o Valadares seu bar predileto. Ele se tornou conhecido por sua participação no quadro “Chame o Síndico” do programa Fantástico e tem a coluna Condomínio Legal na Rádio CBN. Nesta entrevista, ele revela os problemas mais comuns de quem vive em condomínio e dá dicas de como solucioná-los.

Qual é o segredo para se viver em condomínio?
É o diálogo, é a conversa. Barulho, por exemplo. Em vez de reclamar na portaria ou pedir para o síndico multar, procure seu vizinho e converse com ele. Geralmente funciona.

Quais são os principais problemas de um condomínio?
Antes era inadimplência e vazamentos. Hoje, temos problemas seríssimos com garagem, barulho, crianças, cachorros, salão de festas, segurança, e outros. O leque vai aumentando…

As brigas têm aumentado?
Muito. Primeiro porque muita gente migrou de casas para condomínios e não se preparam para viver a nova realidade com eles e seus filhos. Muitas vezes, falta tolerância entre eles.

E quando a conversa não resolve? O que fazer?
Temos dois tipos de ação. O condomínio pode ajudar ao morador incomodado. O síndico pode mandar uma advertência, uma multa e até caracterizar o morador barulhento como antissocial, que é aquele morador que reiteradamente descumpre as regras. Ele pode ser multado em até dez cotas do valor do condomínio.

E o outro tipo de ação?
Quando a coisa foge ao controle, o morador incomodado também pode agir. Deve notificar, através de carta, o morador para que este pare com esse ato lesivo. Se não surtir efeito, pode abrir até um inquérito policial. O infrator está cometendo um crime de perturbação do sossego alheio. E pode ser condenado em um processo criminal.

Defina o morador antissocial.
É um conceito subjetivo. Apareceu em 2003, no atual Código Civil. Mas o legislador não definiu o que seria. Por definição, é aquele morador que reiteradamente descumpre as normas e as leis e não permite uma convivência harmoniosa. É aquele que estaciona seu carro fora da vaga, leva convidados à piscina, embora o regulamento não permita. Deixa o som alto e não liga mesmo com as reclamações dos outros moradores…

Dos barulhos no condomínios, qual incomoda mais?
O que é rotineiro. Temos um potencial enorme de criar barulhos. O liquidificador logo pela manhã, o secador de cabelo, as mulheres que usam sapatos de salto e o toc-toc-toc pelo apartamento com certeza vão incomodar o vizinho debaixo. É comum deixarem os pets na varanda e o animal latir o dia inteiro, por falta de comida ou água, atormentando à vizinhança.

As construtoras não pensam nisso antes de construir?
Critico esses grandes empreendimentos. Eles são concebidos para receber uma grande população, bons espaços, mas não têm isolamento acústico para economizar na construção. Falta atenção e cuidado por parte das construtoras. Nos apartamentos e nas áreas comuns, como salão de festas.

Os salões de festas geram muita reclamação?
Os moradores precisam saber que festa em condomínio se assemelha às reuniões. Baladas e festas devem ser feitas em outro lugar. Os condomínios podem limitar o número de convidados, determinar horário de início e fim. O regulamento interno precisa ser bem redigido.

Qual a razão das assembleias de condomínios serem desprezadas?
É preciso que as pessoas entendam que as assembléias são importantes. Tanto as gerais como as extraordinárias. É lá que se decide o que vai acontecer durante o ano inteiro e geralmente atinge o bolso dos moradores. Depois não adianta reclamar que o condomínio está caro… Apesar de ser chata, vale a pena comparecer às assembleias. É um papel de cidadão.

Como deixá-las mais atraentes?
Determinar o tempo de início e fim é bom. Síndico que tem administração transparente já evita polêmica. Se ele disponibiliza as informações e as contas e descentraliza o poder, as reuniões são mais tranquilas. Um segredinho: se o presidente da assembleia for um morador que conheça o condomínio e tem perfil conciliador, ajuda muito. E quando a reunião é rápida, com resoluções inteligentes e sem briga, na próxima, os moradores comparecem.

Quanto tempo um síndico deve ficar no comando?
O cargo muitas vezes encanta as pessoas só pelo poder. O rodízio é interessante. É sempre bom ter gente com ideias novas. Por exemplo, uma pessoa ter inúmeras procurações em uma assembleia deve ser evitada. Mas para alterar a Convenção do condomínio é preciso ter a aprovação de 2/3 dos moradores. É um grande problema.

Qual sua opinião sobre síndicos?
Sou um defensor deles. São abnegados, na maioria. Deveriam receber salário. Têm responsabilidade legal na esfera civil, criminal, tributária, trabalhista e previdenciária. Eles respondem por tudo que acontece. Chamo-os de pacificadores sociais. Cuidam do dinheiro e do dia a dia dos moradores.

E os síndicos profissionais, são indicados em que situação?
Atuo como síndico profissional para alguns condomínios. Em prédios comerciais, funcionam bem. Em prédios residenciais, com até 100 apartamentos, eu não recomendo. Os maiores precisam, além dele, de uma boa equipe de apoio – administradora, zeladores e departamento jurídico para funcionarem bem.

E os pets?
A cada dia, cresce o número de pets nos condomínios. É preciso que os moradores escolham os animais de acordo com o tamanho do apartamento. Os condomínios não podem proibir os moradores de ter pets. O que se costuma é determinar o tamanho que pode e o que não pode, e o que o morador pode ou não pode fazer com seu pet.

Uso de áreas comuns por visitantes causa reclamação?
Depende do que está escrito na convenção. Morador tem direito de utilizar todas as áreas do condomínio. Visitantes, normalmente não podem. Hóspedes que ficam um tempo morando no prédio podem. Basta o morador informar ao condomínio.

E a segurança?
Segurança não combina com conforto. Os moradores precisam entender que a segurança depende deles. Não adianta equipar e preparar funcionários se o morador não colabora. O porteiro não é um agente de segurança e por excesso de tarefas acaba abrindo o portão para um morador que buzina e reclama se ele não abrir. Todos precisam colaborar.

E quando os moradores utilizam os funcionários do condomínio para serviços particulares?
Não pode. Eles estão lá para servir ao condomínio. E o que é mais grave é o risco trabalhista. Se o funcionário do condomínio servir o morador e se acidentar, a responsabilidade é do condomínio. E se ele fizer isso regulamente, pode acionar o condomínio e isso envolve risco trabalhista.

E a acessibilidade nos prédios?
É lei municipal, estadual e federal e tem muitos condomínios que estão irregulares. Preferem investir em nova decoração. Acessibilidade é para todos, para quem mobilidade reduzida temporária ou não. É uma questão de cidadania, além de seguir as leis.

Algo mais?
Um assunto importantíssimo para os prédios novos é que os moradores deveriam contratar um perito para se certificar de que tudo foi construído sem falhas. Em caso de erro, as construtoras precisam consertar. Os prédios têm prazos de garantias e se os condôminos não descobrirem os defeitos, perdem o direito de reclamar às construtoras.

Para finalizar, resuma o que é viver em condomínio.
É uma arte. De respeitar o próximo, de viver em grupo, de coletividade, de tolerância (palavra chave) e bom senso. E acima e tudo, é o exercício de viver com pessoas de hábitos e culturas diferentes das nossas. Mas que dividem um espaço comum. Recomendo para todos, tolerância e diálogo.

www.rachkorskyadvogados.com.br

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