Um apoio à educação

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O Brasil tem um grande número de causas a enfrentar, como menores e idosos abandonados, populações de rua, analfabetismo e, especialmente, a melhoria da educação, mola propulsora do desenvolvimento do País. A sociedade, aos poucos, vem se conscientizando da necessidade de se organizar para estimular as pessoas a contribuírem com dinheiro e bens ou a trabalharem como voluntárias para amenizar os problemas sociais.
Com base no sucesso das campanhas financeiras, realizadas ao longo da história do Instituto Mackenzie, o economista Custódio Pereira escreveu o livro “Sustentabilidade e Captação de Recursos na Educação Superior do Brasil”. Com esta obra, ele pretende provar que é possível desenvolver a participação da comunidade para apoiar financeiramente projetos de melhoria da educação, por meio de novas edificações, bibliotecas, laboratórios e parcerias na pesquisa, independentemente do país e da sua cultura, mesmo nos dias de hoje.
Custódio Pereira é pós-graduado em finanças, especialista em ensino superior e gestão universitária. É também autor do livro “Captação de recursos: conhecendo melhor as pessoas que contribuem” (Fund Raising). Atualmente, Custódio é diretor das Faculdades Integradas Rio Branco, localizada na Lapa.

Quando o senhor fala em sustentabilidade e captação de recursos na educação, em que se aplica?
Este tema pode até gerar um pouco de dúvidas porque as pessoas não estão acostumadas a uma nova forma de sustentabilidade, a uma nova forma de captação de recursos. Quando se fala nisso, pode ser que se entenda como formas alternativas de financiamento, formas de pegar empréstimos, formas de capitalização, e não é nada disso. Inclusive tem como objetivo romper os paradigmas da nossa cultura. A nossa cultura tem mantido uma condição onde não existem outras formas de sustentabilidade que não aquela tradicional. O livro objetiva apresentar como absolutamente possível uma nova forma de sustentabilidade já existente no mundo; existe nos Estados Unidos, na Europa, na Ásia e em alguns países da América Latina e também existe no Brasil, mas de forma esparsa.

No Brasil?
Sim. No Brasil existem algumas instituições que estão, de maneira insipiente, fazendo alguma coisa. Só que elas não conversam e não se reúnem; não trocam experiências e nem começam outras experiências. Quer dizer, enquanto nos Estados Unidos existem centenas de publicações sobre captação de recursos, sustentabilidade nas escolas e nas universidades, além de outros setores, escrevi o primeiro livro no Brasil sobre o assunto. O que é uma oportunidade, mas também é a constatação de como nós estamos defasados em relação a uma oportunidade maravilhosa. Todo mundo fala, todo mundo reconhece que o nosso principal foco é a educação. No entanto, não propiciamos mecanismos para a sociedade civil poder, de alguma maneira, participar. A legislação não ajuda, ela inclusive prejudica. Primeiro porque o doador para bolsas ou para uma universidade não tem nenhum incentivo, e quem recebe ainda paga uma taxa. Estamos na contra-mão do que está acontecendo no resto do mundo, principalmente da Europa e nos Estados Unidos. Lá, os doadores têm incentivos para doar e quem recebe não precisa pagar nada.

Culturalmente, fazer doação para universidades e faculdades funcionaria aqui?
A sua pergunta é a mais instigante. Eu vou te responder com uma outra pergunta: se for uma questão cultural e a nossa cultura é muito parecida com a do México, como é que no México, na Universidade de Monterrey, foi feita uma campanha de captação de recursos, acho que de 1996 a 2001, e foram arrecadados 27 milhões de dólares? Como é que esta mesma universidade está fazendo a sua segunda campanha de captação de recursos e está recebendo dinheiro de alunos, funcionários, antigos alunos, da comunidade, e já captou 15 milhões de dólares? Por outro lado, no livro, coloco a experiência do Mackenzie. Em 1953, uma instituição protestante num país católico, privada, de origem norte-americana: como é que eles captaram, naquela época, cerca de 14 milhões de dólares? E isso foi no Brasil, em São Paulo. O que mudou? Era cultural? Sim. Por não saber que era impossível eles foram lá e fizeram. O tema do livro é discutir isso e eu espero contribuir para o debate sobre o assunto. Assim começaríamos, mesmo que lentamente, um processo de mudanças, mudança de mentalidade. Você fala cultura, eu diria que nós estamos no começo de um processo. E tudo que é começo tem um pouco de caos. Quando se diz que as pessoas não doam é porque não pedimos. E se pedimos, não sabemos pedir. Nós não estreitamos relacionamentos com alunos e antigos alunos. Quantas instituições dão bolsas de estudos e, quando estes bolsistas terminam o curso, acabou, eles não mantém vínculos com a universidade. Esses vínculos têm que ser estabelecidos quando o aluno ainda está estudando.

É assim que se forma um doador potencial, como o senhor cita no livro?
Sim. E isto é um exercício profissional. Voltando a falar dos antigos alunos, as instituições não estão preocupadas em formar o que eu chamo de ‘espírito de corpo’. Como se forma isso? O nome da sua universidade, as competições atléticas, a participação em fóruns e debates, aonde o aluno vai ele defende a instituição. Assim se cria um espírito de corpo. Quando o aluno sai da universidade, ele sai enturmado, mantêm o networking, tanto com os outros alunos quanto com a universidade. Mesmo que ele não doasse absolutamente nada, ele teria um amor maior pela instituição, um reconhecimento maior e estaria pronto, nas áreas de atividades que ele viria a exercer, a ajudar a instituição porque quanto melhor, quanto mais forte estiver a instituição, quanto melhor for o nome dela, melhor é o diploma dele. Eu sou formado em Harvard! Maravilhoso, mas se Harvard estiver no buraco, se ela fechar, não adianta.

E as pessoas não têm essa consciência.
Não têm. E ao se formar essa cultura do doador, por outro lado também é preciso saber pedir. Há a hora de pedir e é preciso saber a quem pedir. Preciso saber quem são os meus doadores potenciais. Depois tenho que fazer um trabalho de aproximação, partindo do princípio de que este trabalho já exista com os antigos alunos. É preciso que tenha um profissional que faça isto. Quando a instituição já tem um vínculo com as pessoas, fica mais fácil a aproximação. A chance de êxito é maior. Quem é meu potencial doador? Preciso identificar. Tenho que fazer um plano estratégico. Se eu souber mais ou menos quanto você pode doar, posso pedir o valor que eu acho que você pode doar. Ou, na dúvida, um pouquinho a mais. Mas se eu pedir um valor enorme, você pode dizer que não é possível. E você só vai contribuir com aquilo que você acredita. Então, eu preciso conhecer o meu doador para o programa adequado. E tem o momento certo para pedir. Tem mais: se você acredita numa causa – não acreditamos na educação? -, precisamos saber colocar essa causa, precisamos resgatar a dignidade porque quando a pessoa não tem educação, se ela não tem conhecimento, como é que vamos desenvolver o nosso País? As elites vão continuar existindo, porque se não existe elite financeira, existe elite de conhecimento. E nós temos a responsabilidade, como educadores e como cidadãos, de construir um País melhor. Não adianta conversa, não adianta cesta básica. Tem que ter educação e trabalho. Se você tem uma causa certa, é como diz John D. Rockefeller: “Nunca pense que precisa pedir desculpas por pedir a alguém que doe para uma causa que acredita, é como se você estivesse dando a ele a oportunidade de participar de um investimento de alto nível. O dever dele em dar é igual ao seu de pedir”. Em contrapartida, é preciso haver uma cultura da empresa de ser transparente e prestar contas. Isso tem que ser criado.

A doação para instituições de ensino é prevista na legislação brasileira, ou seja, é um dever ou um direito de qualquer cidadão fazer doações para universidades ou escolas?
Não, não existe. A nossa lei não está organizada para este tipo de situação. Mesmo que você queira doar é muito complicado para as instituições receberem. Se eu quiser doar uma propriedade para determinada universidade, por exemplo. É preciso criar uma fundação que receba essa doação e que administre a propriedade com a universidade. É preciso mudar a nossa cabeça. Tem muita gente que se formou aqui nas nossas universidades públicas e fez mestrado, doutorado em universidades estrangeiras. Pergunta para eles se eles não contribuem para estas universidades do exterior? Contribuem. Está errado? Não, não está. É que nós não sabemos pedir aqui. Não tem estímulo.

Esta proposta pode ser estendida para as escolas de ensino básico e fundamental?
Sim, para todas as escolas. Eu diria que tem um forte viés no ensino superior, no entanto é aplicável para a educação básica e fundamental. É uma forma de confiança. Eu preciso contribuir com a escola. Se não posso contribuir financeiramente, vou participar de mutirão! A sociedade precisa acordar porque se não fizer isso vão passar na nossa frente. Esta é uma forma de melhorar, de conseguir recursos para as instituições.

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